Resumo do artigo de Bahro: “Ecologia e Perpectiva Socialista”

Liszt Vieira

A problemática da crise ecológica constitui o crivo pelo qual devemos passar toda a nossa concepção política e teórica. É a questão chave que o movimento socialista se colocará nas próximas décadas. Hoje estamos apenas no início da assimilação teórica, psicológica e prático-política dessa crise.

O autor se reporta à crise do marxismo e faz um balanço do que se esperava – com Marx, desde os anos 40 do século XIX – que acontecesse.

Em primeiro lugar, o desdobramento e aguçamento das contradições internas de classe nos países capitalistas do século XIX provocaria não somente a solução proletária geral para os problemas da civilização européia, mas a solução para a humanidade em geral. E isto não ocorreu.

Lendo Marx, constatamos que seus escritos políticos e sobretudo suas análises econômicas foram em grande medida confirmadas enquanto descrição da realidade (por exemplo: a exploração). Mas as conseqüências políticas derivadas da análise não se verificaram. Não se realizou a esperança numa ruptura revolucionária nos países capitalistas altamente desenvolvidos.
Já a revolução russa indica que o aguçamento decisivo das contradições de classe se deslocou à periferia do sistema capitalista. Com a revolução russa, passamos à dominância das contradições externas sobre as contradições internas nos países desenvolvidos.

Tais contradições externas atuam não apenas no sistema capitalista mundial, mas também na civilização capitalista em seu conjunto, abrangendo esta última expressão os países de “socialismo realmente existente” também não se produziu a ruptura com o horizonte da civilização capitalista, da civilização burguesa. Na própira maquinaria, na própria tecnologia, já está instalado o capitalismo, o domínio de classe, a exploração. A maquinaria, a tecnologia capitalista, as forças produtivas capitalistas, enfim, o fundamento da civilização capitalista continuam sendo o horizonte dos países de “socialismo realmente existente”.

Nesta perspectiva, as contradições internas nos países desenvolvidos (trabalho assalariado x capital, com todas as suas implicações) superpõem-se 3 contradições externas.

1) Conflito Leste-Oeste que impulsiona em todas as partes o proceso de crescimento capitalista das forças produtivas, colocando em perigo, através do mecanismo da corrida armamentista, a sobrevivência da humanidade.

2) Problemática Norte-Sul, com o enorme desnível de renda per capita no eixo norte-sul, desnível esse que é agravado pelas lutas – justas, sem dúvida – para aumentar o nível de vida das massas nos países desenvolvidos. As lutas de classe internas nos países desenvolvidos já se resolvem em grnde parte sobre as costas dos povos subdesenvolvidos.

3) Crise Ecológica que expressa a contradição “homem x natureza” constitui a questão chave onde tudo acabará desembocando.

O que significa realmente a Crise Ecológica?

Diversas matérias primas se esgotarão em futuro previsível (petróleo em 70 anos, carvão em 400 anos), colocando em risco a sobrevivência da humanidade. Devemos refletir como transformar a civilização em seu conjunto – o que significa em primeiro lugar nossas forças produtivas – para assegurar a existência da humanidade para as gerações futuras. A crescente escassesz de recursos agrava asituação mundial, tornando as guerras mais prováveis. Nos anos 80, essa crise de recursos coincidirá com uma crise no processo de valorização de capital. Reduzindo a taxa de crescimento e aumentando o nervosismo das classes dominantes.
A crise ecológica não é um problema isolado de sobrecarga do meio ambiente. É antes de tudo um porblema de recursos e basicamente de matérias primas. Estamos chegando ao último escalão das matérias primas sobre as quais se baseia a nossa civilização.

Por outro lado, a crise ecológica é o vértice da necesidade geral que tem a humanidade de libertar-se da ordem econômica capitalista. Nos países desenvolvidos, a crise das forças produtivas coincide diretamente com a crise da subjetividade, do indivíduo.

A crise ecológica surge do desenvolvimento da economia capitalista baseada na criação da mais valia qualquer preço, que absorve cada vez mais novas massas de matérias primas no processo de produção. Detrás da crise ecológica, está a concorrência dos super-monopólios atuais, reforçada pelo aporte de capital estatal. Eis aqui o mecanismo motriz quq tem que ser detido.

Devemos nos propor a consecução de uma ruptura nesse mecanismo motriz capitalista que ameaça a sobrevivência da humanidade. Mas o sujeito que até agora havíamos previsto, o sujeito proletarirado, tal como o havíamos definido não produzirá ruptura.

A revolução russa não fracassou no que se refere ao desenvolvimento das forças produtivas, mas não gerou socialismo. Embora ressltando sempre a vinculação estreita entre forças produtivas e relações de produção, o marxismo privilegiou as relações de produção (exploração) como alvavanca das transformações.

A crise ecológica significa que nos encontramos agora perante o desafio de situar o centro de gravidade do problema nas forças produtivas. Como não foi possível até agora romper as relações capitalistas de produção a partir de um impulso político baseado na contradição trabalho assaliariado x capital, chegou-se a um ponto em que a crise ecológica se lança a partir das forças produtivas, isto é, do fundamento da nossa civiliazação, deslocando a luta de classes tradicional a um segundo plano. Como a luta salarial perdeu aquela significação existencial, explosiva dos séculos 18 e 19 e como a luta sindical permaneceu encerrada no interior da sociedade burguesa, já não se pode a aprtir daí fundamentar nenhuma perspectiva socialista.

Marx assinalou nos “Grundrisse” que os operários industriais constituem uma classe tendencialmente em desaparecimeno. Por outro lado, de 80 a 85 % dos membros das sociedades desenvolvidas são assalariados. Para a política prática, deveríamos partir deste amplo sujeito, mas na hora de traçar uma estratégia, pensa-se prioritariamente em organizar os operários fabris, o que, evidentemente, é muito pouco.

Não se trata de negar o que representou e defendeu o movimento operário tradicional (limitação do poder do capital, luta distributiva), mas sim de achar novas prioridades, uma estratégia que tenha como ponto de partida o trabalhador coletivo da sociedade capitalista altamente desenvolvida.

Encarecendo a necessidade de aprender a atuar por cima das divisões ideológicas existentes no interior desse trabalhador coletivo, Bahro manifesta sua adesão ao Partido Verde, por achar que tal partido ecológico é o catalisador da vinculação do movimento de base (cujo caráter, ao menos potencialente, é anti-capitalista) com uma praxis política em escala nacional.

Agosto de 1981